A VOCAÇÃO LEIGA
Como sabemos, a vocação é algo comum a todos os seres humanos: todos fomos chamados por Deus à vida e à santidade (Ef 1,4); todos fomos criados por Deus e para Deus, e ninguém se realiza fora dessa identidade e dessa vocação, como disse Santo Agostinho.
Dessa vocação básica brotam todas as outras, pois cada um é chamado a viver a mesma e única santidade segundo a missão específica que Deus lhe confia, conforme a inspirada imagem do “corpo místico” usada por São Paulo (1Cor 12,12-30): no corpo, os diversos membros exercem funções diferentes, mas complementares; uns precisam dos outros, e todos trabalham juntos para o mesmo fim, que é o bem do corpo.
No caso da vocação leiga, como indica o Documento de Aparecida, sua principal característica é a presença e a ação no mundo, a missão de santificar, iluminar e fermentar, com o testemunho de uma vida segundo o Evangelho, os ambientes “seculares”, isto é, aqueles onde a Igreja se faz presente principalmente – e às vezes somente – por meio deles, ou seja: o mundo do trabalho, da cultura, das ciências e das artes, da política, das relações internacionais, dos meios de comunicação e da economia, assim como as esferas da família, da educação, da vida profissional, da promoção social (DA 174 e 210).
Transformar as realidades humanas, humanizando-as e santificando-as por meio dos valores cristãos, é também a missão da Igreja hierárquica e das vocações consagradas. Mas é principalmente por meio dos leigos que esses valores poderão fecundar os ambientes acima mencionados.
Uma olhada na lista desses ambientes nos revela de imediato a amplitude da nossa missão, e a grande dificuldade de executá-la, no contexto de uma sociedade que rejeita Deus e despreza a fé. Como evangelizar os meios de comunicação e as expressões artísticas, tão empenhados na destruição dos valores mais sagrados e mais essenciais à dignidade humana? Como evangelizar o mundo da política, tão dominado pela corrupção e pelos interesses egoístas? Como evangelizar o universo da ciência e do saber, tão convencido da onipotência da razão humana e do relativismo da ética? Mas é aí que nós, leigos cristãos, somos enviados como cordeiros entre lobos... (Lc 10,3) É aí que somos chamados a dar o testemunho da nossa fé e a razão da nossa esperança (1Pd 3,15), aplicando os talentos específicos que Deus nos concedeu para com eles trabalharmos, no interesse do Senhor (Mt 25,14-30). Pois ele é o dono da messe, e nós somos seus instrumentos.
Seremos instrumentos eficazes na medida de nossa fidelidade e docilidade à ação de Deus em nós e por nós. E é por isso que, como tanto enfatiza o documento de Aparecida e também o Doc. 94 da CNBB, é preciso trabalhar profundamente o discipulado, antes de trabalhar a missão. A condição essencial para dar testemunho cristão é SER CRISTÃO, viver como cristão, buscar a santidade em nossa vida pessoal. Ninguém pode dar o que não tem... Toda missão começa, portanto, por uma caminhada de conversão pessoal, que deve ser contínua, pois a conversão é um processo que dura a vida inteira. Se estivermos apaixonados por Cristo, toda a nossa vida dará testemunho dele (cf. DA 146). Pois a missão nada mais é do que compartilhar a experiência do encontro do Cristo que transforma a nossa vida (cf. DA 145).
Dentre os campos de ação do ministério leigo, é importante destacar a família. Embora a vocação matrimonial já tenha sido lembrada no segundo domingo de agosto, vale a pena insistir neste ponto, já que a vocação familiar é a vocação leiga por excelência, e é também a base de toda formação humana. Jamais poderá haver uma sociedade digna e forte sem famílias dignas e fortes, e por isso o nosso primeiro e maior empenho, como leigos cristãos, deve estar voltado para a promoção da família e a corajosa rejeição de tudo o que se opõe a ela, como a desvalorização do sacramento do matrimônio, a banalização da vida humana e das relações afetivas. Como sabemos, a mentalidade de hoje exclui abertamente o compromisso, a responsabilidade no uso da liberdade, a fidelidade e a generosidade no cuidado com os filhos, promovendo apenas a satisfação pessoal egoísta e imediata, em nome de uma “felicidade” ilusória. Entretanto, o amor humano só encontra sua plenitude quando participa do amor divino e se espelha nele (DA 117), e o amor divino é essencialmente comunhão, doação e fidelidade. Por isso a família deve estar ancorada e ser sempre alimentada pela graça de Deus, por meio do sacramento do matrimônio e da inserção na comunidade eclesial. O que temos feito nesse sentido? Que testemunho de família estamos dando? Quais são os valores que buscamos viver e transmitimos aos nossos filhos? “Não vos conformeis com este mundo”, diz São Paulo (Rm 12,2), e isso significa não aceitar o modelo imposto pelo mundo, mas saber remar contra a corrente e defender com firmeza os valores da fé, conforme o ensinamento da Igreja, que é o de Cristo.
Os leigos também são chamados a participar diretamente da ação pastoral da Igreja, exercendo diversos ministérios no campo da evangelização, da vida litúrgica e outras formas de apostolado, segundo as necessidades locais e sob a guia de seus pastores (DA 211). Destacamos aqui o ministério da catequese, tão importante para a formação cristã das crianças, jovens e adultos. Por isso, neste domingo dedicado à vocação leiga, celebramos também o Dia do Catequista.
Não podemos esquecer também os diversos movimentos leigos e comunidades de vida que tanto enriquecem a Igreja com seu testemunho e serviço, especialmente na catequese e no atendimento às inúmeras carências de nossa sociedade. Em qualquer caso, o segredo de uma vocação bem vivida está em saber ouvir e corresponder com generosidade ao chamado que Deus faz a cada um.
Para cumprir adequadamente a sua missão evangelizadora, os leigos necessitam de sólida formação espiritual, doutrinal e pastoral, além de adequado acompanhamento (DA 212). Por isso, “os melhores esforços das paróquias neste início do terceiro milênio devem estar na convocação e na formação de leigos missionários” (DA 174). Os leigos são “homens da Igreja no coração do mundo, e homens do mundo no coração da Igreja”
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